domingo, 6 de março de 2011

PARE!

- PARE! – berrou a placa – Proibido seguir em frente.
- Como assim? Não posso parar. Vê a estrada de tijolos amarelos? É o meu caminho, tenho que seguir.
            Insistia. Argumentava. A cada tentativa de dar um passo, a placa tornava-se mais vibrante e maior. Colocava-se à sua frente e impedia a passagem.
            - Não me interessa, pegue um retorno, vire à direita. Ou à esquerda. Dê meia volta, eu não me importo.
            - Sai da frente! Anda! Você não pode fazer isso! Preciso ir. Vê o mapa? Indica claramente a estrada amarela. Não há outra possibilidade. Não há volta, nem retorno. Sai!
            A melodia estridente daquela discussão foi então silenciada. Gritos apressados se aproximavam. Vinham de um coelho branco que usava gravata. Pulos misturados com corridas e tropeços eram intercalados por rápidas olhadelas no relógio que trazia na mão. Passou por ela bufando e repetindo:
            - É tarde! É tarde! Tenho pressa! É tarde! Tic-tac, tic-tac. Tenho pressa! – e sumiu no fim da paisagem. Ela não pôde evitar o incômodo que sentiu com aquele encontro repentino. Não sabia o porquê. Sabia, porém que precisava continuar seu caminho. Tinha agora ainda mais urgência. Agitada, se debatia contra a placa.
            Suava. O calor lhe percorria o corpo. Porém sentiu uma chama ainda maior queimar sua pele. Olhou pra cima e viu um cometa riscando o céu e vindo em sua direção. Tirou de sua mochila uma rede de caçar borboletas. Esticou-se ao máximo e... zup! Alcançara o cometa. Sentia seus pés saírem do chão e se afastarem cada vez mais dele. Satisfeita, percebeu que se desviara da placa e agora voava alto. Sentiu os braços doloridos mas se agarrava firme. Fechou os olhos. No meio de tanto ardor sentiu a frescura do vento.  E imaginava seu destino, o fim da estrada.
            Abriu os olhos. Olhou para baixo. Era uma visão devastadora. A estrada de tijolos amarelos, como um fio dourado desenrolado, rabiscava um traçado estranho no chão. Não batia com o desenho do mapa que carregava desde a infância. Percebeu, desiludida que o que via era um caminho sem fim, que se entrelaçava em túneis e viadutos, curvas e ruas sem saída, pipocados de placas berrantes, sem nunca levar a lugar algum.
            Os olhos se encharcaram de ira e desespero. Ela bate os calcanhares repetidamente, insistentemente. Nada acontece. Olha ansiosa para seus sapatos vermelhos. Já não estavam mais tão vermelhos. Além de arranhados e gastos da caminhada, o cometa os havia chamuscado. Nada. O emaranhado continuava lá, com suas placas pulando em uma coreografia frenética.
            Então ela se solta. Vencida, se solta. Cansada. Já não quer mais voar. E cai, leve como uma pluma, entorpecida, resignada, lentamente. Cai de volta ao mar amarelo. Ao fundo um sussurro letárgico, uma voz conhecida, a invade, a preenche.  Apenas o que ouve é o som daquela voz que, desde então, nunca mais saiu de sua cabeça, dizendo: - Tenho pressa! É tarde! É tarde! Tic-tac, tic-tac. É tarde!...

- fev 2007

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